Física,Química,Matemática(Atividades para os Alunos)

sexta-feira, 24 de julho de 2020

A biodiversidade e toda a vida do mundo



Martha San Juan França
Há mais vida na Terra do que o homem é capaz de saber: fala-se de 5 a 30 milhões de espécies. A biodiversidade fascina os cientistas, preocupados em conhecer e salvar toda essa riqueza.

Nos tempos bíblicos, Deus ordenou ao patriarca Noé que construísse uma arca para abrigar um casal de cada espécie de bicho enquanto o mundo se afogava no dilúvio universal. A missão de Noé pode ter sido ainda mais extravagante do que a lenda sugere. De fato, passados dois séculos desde que o botânico sueco Carolus Linnaeus (1707-1778) começou a classificar as formas animais e vegetais de vida, não se sabe quantas espécies dotadas de patas, rabos, antenas, asas, guelras, folhas, caules ou raízes existem. "Em todas as classes, a cada dia se descobre uma espécie nova", garante o zoólogo Miguel Trefaut Rodrigues, da Universidade de São Paulo. Há algum tempo, com outros pesquisadores, ele passou vinte  dias enfurnado na Mata Atlântica do sul da Bahia, onde encontrou nada menos de catorze espécies ao que tudo indica desconhecidas de répteis e anfíbios, incluindo uma perereca que, com seus 10 centímetros de comprimento, talvez seja uma das maiores da América do Sul.
Isso é biodiversidade, o explosivo potencial que a vida possui de se multiplicar em miríades de formas adaptadas aos mais variados ambientes. Desbravando o globo de pólo a pólo, embrenhando-se em florestas e mergulhando nos mares, o homem conseguiu descrever 1,4 milhão de espécies, como se designa a unidade biológica fundamental. Cerca de 750 000 são insetos, 41 000 são vertebrados, 250 000 são plantas e o restante é uma coleção desconjuntada de outros invertebrados, algas, fungos e ainda microorganismos como bactérias e vírus. Parece um desvario da natureza — mas é pouco mais do que uma amostra. A maioria dos biólogos concorda que aquele censo não dá conta nem da terça parte dos passageiros convidados a embarcar na arca de Noé.
Os cientistas reconhecem, por exemplo, serem parcos os seus conhecimentos sobre a diversidade e a distribuição dos insetos, uma categoria que parece ter a preferência da natureza, pois constitui folgadamente a maioria dos seres vivos. O pesquisador americano Terry Erwin e seus colaboradores do Instituto Smithsonian de Washington tiveram a santa paciência de contar, uma a uma, as espécies de bichinhos nas copas de algumas árvores na Amazônia brasileira e peruana e extrapolaram o número encontrado para a área total de florestas tropicais. Resultado: somando as espécies estimadas dos insetos às outras presumivelmente existentes ali, obtiveram um megatotal de 30 milhões de formas distintas de vida. Mesmo quem acha que esse é um cálculo inflacionado  demais aceita a hipótese de que pelo menos 5 milhões de espécies povoam o mundo. E não há dúvida de que a maioria anônima está escondida no verde e na água das florestas tropicais.
Sabe-se preto no branco que mais da metade da bicharada do planeta tem seu endereço nos trópicos, mais precisamente nos 7% da superfície do globo coberta por florestas tropicais. A desmedida variedade das espécies vegetais ainda é menor que a de insetos, peixes e microorganismos. Uma pesquisa recente mostrou que 950 espécies de besouros, 80% das quais desconhecidas, estavam instaladas em apenas dezenove árvores da selva tropical do Panamá. Como em cada hectare da Floresta Amazônica existem 300 espécies de árvores, dez vezes mais do que nas regiões temperadas da América do Norte, por exemplo, não é de espantar que o Brasil, onde a floresta ocupa 42% do território, seja o campeão mundial da biodiversidade.
Segundo uma classificação elaborada pela respeitável organização ambientalista internacional World Wide Fund for Nature (Fundo Mundial para a Natureza), o Brasil é o primeiro país do mundo em número de espécies de plantas e de anfíbios, o terceiro em aves e o quarto em borboletas, répteis e mamíferos. "Das 1 100 espécies conhecidas de sempre-vivas (um tipo de flor comum em adornos), 700 encontram-se entre Minas Gerais e Bahia", contabiliza a botânica Ana Maria Giulietti, da USP. "Só numa lagoa do Parque do Rio Doce, em Minas, existem mais espécies de libélulas do que em todo o território britânico", compara, por sua vez, o entomologista Ângelo Machado, da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Ele é também presidente da Fundação Biodiversitas para a Conservação da Diversidade Biológica, uma entidade de cientistas ambientalistas  criada há dois anos em Belo Horizonte que, como o nome já diz, se dedica à defesa desse incomparável tesouro que o homem vem dilapidando.
Machado explica por que "nossas várzeas têm mais flores, nossas flores têm mais vida", como se gabam os versos ufanistas de Gonçalves Dias. "No passado", ensina ele, "as zonas temperadas sofreram o rigor das glaciações, que sacrificaram inúmeras espécies e empurraram outras a regiões de climas mais quentes. Enquanto isso, próximo dos trópicos, o ambiente permaneceu estável, o que facilitou o desenvolvimento de ecossistemas mais ricos e complexos, adaptados a um clima com pouca variação." É o que aconteceu, não apenas no Brasil, mas também no México, na Colômbia, na África central e no sul da Ásia, igualmente bem situados no ranking da World Wide Fund. A Colômbia é o país mais rico em diversidade de espécies por unidade de área. Já a Indonésia se destaca não apenas pela variedade de espécies terrestres mas por possuir no seu litoral o mais rico tesouro de organismos marinhos.
Mesmo nas regiões tropicais existem áreas de preferência da bicharada. Perplexos com essa valorização, biólogos do mundo inteiro seguiram o exemplo do brasileiro Paulo Emílio Vanzolini e foram buscar respostas na Geomorfologia, ramo da ciência que estuda as formas do relevo terrestre. Baseado por sua vez nos trabalhos de um colega da USP, o geógrafo Aziz Ab’Saber, Vanzolini — um especialista no mecanismo de multiplicação das espécies, também conhecido por seus sambas — descobriu que a distribuição da vida nas florestas da Amazônia e na Mata Atlântica está relacionada à história antiga dessas formações. Durante a mais recente glaciação, que durou cerca de 10 000 anos, nesta parte do globo períodos frios e secos alternaram-se com outros mais quentes.
Quando o clima esfriava, as florestas encolhiam, cercadas por cerrados, pradarias e caatingas. Os pequenos grupos de espécies, isolados de seu território ancestral, lentamente começaram a se adaptar às peculiaridades locais. É o que os cientistas chamam de diferenciação em isolamento, um processo que leva ao endemismo. Este  fenômeno, que ocorre em lugares menos acessíveis, montanhas e ilhas, marcou a peculiar flora e fauna da Austrália — simbolizada pelos cangurus e coalas — assim como da ilha de Madagascar, na costa oriental da África, o paraíso das orquídeas e dos primatas. Muito mais tarde, quando a floresta voltou a se expandir, aquelas espécies já tinham acumulado tantas variações genéticas que perderam por completo o parentesco com seus antepassados.
Comparados às espécies terrestres, os organismos marinhos estão mais bem distribuídos justamente porque toparam com menos barreiras físicas. Não é de estranhar, portanto, que a diversidade de espécies nos oceanos seja também menor. Em compensação, como a vida surgiu na água muitos milhões de anos antes que em terra, os oceanos abrigam formas mais antigas, como algas, moluscos, esponjas e corais. Para o biólogo Eurico Cabral de Oliveira, ex-diretor do Centro de Biologia Marinha da USP, “o equivalente marinho das florestas tropicais são os recifes de coral” — colônias de organismos invertebrados onde vivem numerosas espécies de peixes, moluscos, além de pássaros e tartarugas. "Como as florestas", compara o biólogo, "os corais são ecossistemas complexos e por isso mesmo de equilíbrio delicado."
Por pouco que se saiba sobre as espécies terrestres, ainda é muito comparado com o que se sabe dos oceanos. Recentemente — para surpresa de quem achava que a vida em profusão só existia nas águas mais iluminadas — se descobriu no fundo do Pacífico nada menos de uma centena de espécies estranhíssimas de organismos. Mais do que quaisquer outros terráqueos, são uma prova da incrível capacidade de diversificação e adaptação a todo tipo de ambiente. Costuma-se dizer que a variedade é a própria essência da vida, pois sem a matéria-prima que ela proporciona não haveria evolução. Cada organismo, como se sabe, contém uma quantidade colossal de informações genéticas que determinam todas as suas características. Mas os organismos individuais não evoluem — eles só podem crescer, reproduzir-se e morrer. As mudanças que entram para a história ocorrem nas espécies, a unidade básica da evolução. "Assim, de um mesmo ancestral podem se originar espécies tão diferentes como as lhamas que se adaptaram à Cordilheira dos Andes e os camelos aos desertos da África", lembra o biólogo Vanzolini.
Quando o clima, a água e a alimentação são constantes, as espécies podem repartir o ambiente para não tropeçar umas nas outras, ocupando diferentes nichos ecológicos, como dizem os biólogos. Nas planícies africanas, por exemplo, existem vários tipos de mamíferos que se alimentam de folhagens. Só que as girafas vão buscar o almoço nas copas das árvores, os rinocerontes preferem os arbustos e as zebras comem gramíneas. Mas o destino de uma dada espécie está sujeito a mais interferências do que é capaz de conceber a ciência humana  sem falar que o acaso desempenha um papel não desprezível nessa loteria. Desse modo, sem que se saiba ao certo por quê, algumas espécies tiveram mais sucesso, ao passo que outras passaram despercebidas pelo livro da vida e outras ainda desapareceram abruptamente durante as grandes extinções do passado, como aconteceu com os dinossauros há 65 milhões de ano.
Diante da interdependência e da complexidade dos processos que acontecem na natureza, nunca se sabe quando uma espécie pode representar um papel fundamental para a sobrevivência do homem. Assim, se não por um respeito moral à vida, ou pelo desfrute da beleza que sua variedade proporciona, o mero egoísmo aconselharia salvar o próximo. Não se trata de um raciocínio hipotético. Quem acha, por exemplo, que o mundo estaria melhor sem a enorme variedade de insetos que parecem ter nascido com a exclusiva finalidade de nos infernizar deveria dar uma olhada numa pesquisa feita pelos americanos. Eles calcularam que os insetos causavam um prejuízo de 7 bilhões de dólares anuais nos Estados Unidos. Ruim com eles, pior sem eles. Se os insetos fossem destruídos, os prejuízos que a agricultura teria com a ausência de polinização das plantas seria da ordem de 9 bilhões de dólares. Um exemplo brasileiro: se desaparecesse a mosca que poliniza o cacau no sul da Bahia ou a abelha que faz o mesmo com a castanha no Pará, estaria decretada a falência de importantes atividades econômicas dessas duas regiões.
Com o advento da Engenharia Genética, o estudo da diversidade de animais e plantas tornou-se uma prioridade científica nos países ricos. Isso porque, cada espécie, seja de macaco, barata, rosa ou bactéria, representa um estoque de genes cujo potencial apenas começa a ser arranhado. A humanidade já lucra muito com a herança transmitida por alguns organismos: calcula-se que um em cada quatro tipos de medicamentos contém ingredientes derivados de plantas silvestres. Pacientes com leucemia sobrevivem graças a substâncias contidas numa planta chamada pervinca. A dedaleira ajuda a regular os batimentos cardíacos. O cará proporciona o ingrediente ativo dos anticoncepcionais. O jaborandi combate o glaucoma. A barba-de-bode e a casca do salgueiro têm propriedades analgésicas semelhantes às da aspirina. Fungos e microorganismos—categorias ainda menos identificadas que a dos insetos  foram a chave para o desenvolvimento dos antibióticos e mais recentemente da ciclosporina, o bendito remédio que diminui os riscos de rejeição em transplantes.
O problema é que, para onde quer que se olhe, o homem parece ter declarado guerra às plantas e aos animais. É o desmatamento, os acidentes ecológicos, a ocupação desordenada e a poluição em terra. Os conservacionistas fizeram as contas e obtiveram um número de arrepiar. Se continuar o ritmo atual de destruição da natureza, nos próximos 25 anos cerca de 1,2 milhão de espécies desaparecerão por completo da face da Terra. Ou seja, estamos assistindo sem saber a um genocídio de cem espécies por dia.
O entomologista Ângelo Machado, da Fundação Biodiversitas, se irrita quando lhe perguntam por que conservar animais como o mico-leão-dourado, um primata característico da Mata Atlântica, que está na lista das 207 espécies ameaçadas de extinção elaborada pela Sociedade Brasileira de Zoologia. "O homem é uma espécie curiosa", raciocina ele. "Tem um apreço enorme pelas coisas bonitas que ele mesmo cria, mas destrói as que encontra prontas na natureza. Já imaginou se algum tipo de fungo destruidor de pinturas se alastrasse pelos museus e acabasse com a Mona Lisa ou com as telas de Van Gogh? Antes de mais nada é preciso preservar o mico-leão e outras espécies porque são obras de arte da natureza que levaram milhões de anos para serem criadas."
É possível preservar em parte, em zoológicos, jardins botânicos e bancos de sementes, o muito que ainda resta das espécies. Um exemplo é dado pelo paisagista Roberto Burle Marx. que reúne em seu sítio de Guaratiba, Rio de Janeiro, 3 500 espécies de plantas. Os ecologistas, no entanto, não querem apenas salvar espécies exóticas, mas processos evolutivos. E estes só podem ocorrer nos ecossistemas que Ihes deram abrigo. “Temos que dar chutes na direção certa”, recomenda o biólogo Gustavo Fonseca, que leciona Ecologia na UFMG. "É impraticável preservar indefinidamente os ambientes naturais, mas se pode lutar por uma política realista de áreas de conservação."

Os sobreviventes e as vítimas
O desaparecimento das espécies — e a conseqüente perda do seu material genético — é um fenômeno quase tão antigo quanto a própria vida. Os paleontólogos distinguem cinco episódios de extinção em massa durante os quais uma fração significativa de biodiversidade foi extinta. Os motivos são ignorados ou controversos. O primeiro caso ocorreu no Ordoviciano, há cerca de 450 milhões de anos, quando foram quase eliminados os trilobites, espécies de animais invertebrados. No Devoniano, desapareceu a maior parte das espécies de peixes, diminuíram os corais e os crinóides, animais marinhos. Mas a vida na Terra correu real perigo uma centena de milhões de anos adiante, no Permiano, quando mais de 90% das espécies e todos os trilobites desapareceram. Os sobreviventes abriram caminho para o aparecimento, entre outros, dos dinossauros.
As extinções continuaram. No Jurássico, morreram 75% das espécies de amonites (moluscos) e de crinóides. A mais falada extinção foi a dos dinossauros, que desapareceram no final do Cretáceo junto com os amonites. Em compensação os mamíferos se espalharam pela Terra. Muitos cientistas acusam um descendente desses mamíferos, o homem moderno, de estar promovendo a próxima extinção em massa das espécies. No seu livro O polegar do panda, o biólogo americano Stephen Jay Gould afirma que "aquele que se alegra com a diversidade da natureza e sente que aprende com cada animal tende a considerar o Homo sapiens como a maior catástrofe desde a extinção cretácea".

Comida no congelador
Há quinze anos, a Organização de Alimentação e Agricultura das Nações Unidas (FAO) criou uma rede mundial de recursos genéticos, destinada a salvar centenas de espécies de plantas silvestres das quais o mundo pode vir a precisar como alimento e remédio. São os bancos de germoplasma, o material genético estocado nas sementes, mudas, células e sêmen, guardados em geladeira, a temperatura de 20° C negativos. No Brasil, o Centro Nacional de Recursos Genéticos e Biotecnologia (Cenargen), em Brasília, mantém cerca de 35 mil amostras de sementes de espécies de mandioca, milho, batata, feijão, arroz — alimentos que fazem parte do cardápio da população — e outras que talvez só os índios e os especialistas conheçam. Ao preservar dessa maneira a diversidade da natureza, os cientistas pretendem em primeiro lugar melhorar a produtividade agrícola das espécies conhecidas, especialmente agora que a Biotecnologia e a Engenharia Genética permitem selecionar plantas mais resistentes. Muitas variedades silvestres também podem substituir as vinte espécies de plantas responsáveis pela maior parte da alimentação do homem. Pode chegar um tempo em que espécies como a quinua, um grão que já entrou na dieta básica dos incas, mas é quase desconhecido fora dos países andinos, se tornem uma das mais produtivas fontes de proteína para o homem.

Revista Super Interessante n° 034

Pergunta e Resposta



Perfil do Prêmio Nobel, que tornou-se celebre por seus trabalhos em Mecânica Quântica.
O físico inglês Paul Adrien Maurice Dirac (1902-1984), Prêmio Nobel de 1933, tomou-se célebre por seus trabalhos em Mecânica Quântica, pela teoria sobre o movimento dos elétrons e pelo conceito de antimatéria. Aos 30 anos, foi nomeado professor de Matemática em Cambridge, ocupando a cadeira que no século XVIII fora de Isaac Newton. Ali ficou até 1968, quando se mudou para os Estados Unidos. De temperamento retraído, Dirac gostava de trabalhar sozinho e de dar longas caminhadas. As vezes também sabia ser de uma secura contundente. Certa ocasião, ao final de uma conferência, indagou dos ouvintes se tinham alguma pergunta a fazer. Alguém se levantou e apontou duas equações no quadro-negro: "Não compreendi como o senhor passou de A para B". Dirac devolveu de bate-pronto: "Isso não é uma pergunta. É uma afirmação". E encerrou o assunto.

Revista Super Interessante n° 034

Por trás da arte das cavernas



Cientistas franceses concluíram que os pintores primitivos preparavam as tintas com misturas complexas de diversos minerais diluídos para desenhar e pintar nas cavernas.
Para desenhar nas cavernas, o homem da pré-história tinha uma palheta de apenas duas cores: preto e vermelho. Sempre se acreditou que ele obtinha as tintas misturando água ou com óxido de ferro, para o vermelho, ou com óxido de magnésio, para o preto. Mas um novo estudo mostra que os artistas das cavernas eram mais requintados. Depois de examinarem com microscópio eletrônico fragmentos de 1/10 de milímetro de desenhos feitos há cerca de 12000 anos, cientistas franceses concluíram que aqueles autênticos pintores primitivos preparavam as tintas com misturas complexas de diversos minerais diluídos, não em água, mas em outro solvente ainda não identificado. A surpresa maior, porém, foi descobrir traços de carvão sob a camada de tinta, sinal de que os artistas de então já faziam esboços de suas obras.

Revista Super Interessante n° 034

Por que o Canal da Mancha tem esse nome?



Luciano Oliveira de Morais
Há duas versões: a Enciclopédia Britânica diz que o nome vem do francês manche (manga), numa referência ao desenho do canal que os navegadores franceses do século XVII teriam associado à manga comprida de uma camisa. Já segundo o Dicionário Ilustrado da Enciclopédia Larousse, manche em Geografia quer dizer "braço de mar espremido entre dois pedaços de terra", Situado entre a França e a Inglaterra, com 89 900 quilômetros quadrados e aproximadamente 180 quilômetros na parte mais larga, o canal é chamado patrioticamente pelos ingleses de English Channel.

Revista Super Interessante n° 034

O mais antigo antropóide



Antropólogos ingleses encontram o crânio de um primata, que viveu de 38 a 40 milhões de anos atrás.
Em escavações próximas de uma mina, na desolada região de Fayum, no sul do Egito, antropólogos ingleses encontraram em fins de 1988 um fóssil do tamanho de uma moeda, completamente achatado num pedaço de rocha. Finalmente foi possível identificar a descoberta: trata-se do crânio de um primata, que viveu de 38 a 40 milhões de anos atrás. Ao reconstituírem os dentes, a testa e as órbitas oculares, os cientistas concluíram que o fóssil pertence a um antropóide, ancestral comum do homem e do macaco. Por sua aparência, esse mais antigo fóssil da família antropóide reforça a teoria de que os primeiros primatas surgidos no planeta eram parentes próximos dos atuais lêmures, comumente encontrados na ilha de Madagascar, na costa sudeste da África.

Revista Super Interessante n° 034

Como as abelhas fazem mel?



Mariana M. B. de Carvalho
Glândulas situadas na cabeça dos insetos secretam duas enzimas – a invertase e a glicose oxidase – que reagem com o néctar coletado das flores, formando o mel. A invertase converte a sacarose, um tipo de açúcar contido no néctar, em dois outros açúcares: a glicose e a frutose. A enzima glicose oxidase, por sua vez, transforma uma pequena quantidade de glicose em ácido glicônico, tornando o mel ácido e protegido contra bactérias que o fariam fermentar. Agitando as asas para secar a água, presente em grande quantidade no néctar, as abelhas terminam o trabalho, desidratando o mel e livrando-o de outros eventuais microorganismos.

Revista Super Interessante n° 034

A cor do sexo debaixo da água



O que mais chama a atenção da fêmea ao ver o macho é a cor das escamas na região do ventre.
O que mais chama a atenção da fêmea ao ver um macho? Se for um peixe. a resposta é: a cor das escamas na região do ventre. De acordo com um recente estudo americano, uma barriga de tons bem vivos torna irresistível qualquer macho dos sete mares. Não é uma descoberta nova o fato de que, na maioria das espécies animais, quem decide um encontro amoroso é a fêmea, por sinal bastante exigente na escolha. De espécie para espécie, porém, variam os critérios da seleção sexual.
No caso dos peixes, suspeita-se que a preferência por amizades vivamente coloridas seja a maneira pela qual a fêmea procura evitar parceiros doentes. Afinal, os peixes ficam opacos e apresentam manchas brancas no ventre quando têm alguma doença parasitária. Os cuidados instintivos da fêmea teriam menos a ver com o risco de adoecer do que com a sobrevivência da espécie: parasitados, os machos ficariam menos ágeis para lutar com outros peixes e, no jogo da vida, bom pai é aquele em condições de proteger os filhos - até debaixo da água.

Revista Super Interessante n° 034

Senhores das Trevas



Feios a não poder mais, dotados de lanternas orgânicas e com uma vida sexual incomparável, os peixes do fundo do mar mostram os extremos a que pode chegar a adaptação a um ambiente adverso.
No fundo do oceano, a 4 000 metros, onde a luz do Sol não desce e a temperatura média é de 2ºC, vicejam estranhas espécies de peixes escuros de aspecto horroroso aos olhos humanos, que fascinam porém os cientistas por sua adaptação à vida sob pressões praticamente insuportáveis, pouco alimento e reprodução difícil. São os peixes abissais, formas de vida extremamente peculiares. Alguns têm boca e estômago capazes de engolir e digerir presas com o dobro do seu tamanho. Nas condições do que talvez seja o mais inóspito dos ambientes, por sinal o maior habitat do mundo, muitos desses peixes desenvolveram sistemas orgânicos destinados a iluminar as trevas e atrair as presas: possuem luzes no próprio corpo, que acendem e apagam como lanternas quando necessário.
Na vastidão dos oceanos, os peixes abissais não encontram fronteiras naturais a sua circulação e assim se espalham dos trópicos até as regiões polares. Como não vive em cardumes, é normal que, ao encontrar uma companheira, um desses peixes não se arrisque a perdê-la. Em certas espécies, o macho virtualmente funde-se com a fêmea, transformando-se em um pouco mais do que um depósito de espermatozóides. Até meados do século passado, os cientistas negavam que houvesse vida no mar abaixo de 500 metros. Eles sabiam que, muito aquém da superfície, a água filtra as ondas vermelhas do espectro de luz, deixando visíveis apenas as combinações de verde e azul. Por isso, um mergulhador que cortar a mão a 100 metros de profundidade verá o sangue verde-escuro ou marrom. A 2 000 metros, a esmagadora pressão da água pode arrebentar um cilindro de mergulho.
Explorando os domínios marinhos mais profundos, as missões de pesquisa acabaram descobrindo no entanto que os obstáculos da pressão e da escuridão não são intransponíveis para os peixes. Hoje se sabe que essa classe de vertebrados, a mais antiga que existe, vive em qualquer lugar onde haja água — dos tenebrosos abismos oceânicos até a superfície do mar aberto. Não existe um limite de profundidade para a vida”, assegura o ictiólogo José de Lima Figueiredo, do Museu de Zoologia da Universidade de São Paulo. Há peixes que nadam a 300 ou 400 metros, mas também mergulham em profundidades de 4 000 metros ou mais ainda. Há cerca de vinte anos, os cientistas que estudavam um habitat submarino nas Ilhas Virgens, no Caribe, ficaram surpresos ao ver, numa noite escura, o que parecia um grupo de peixes piscando sem parar no meio de um recife de corais. Descobriu-se que eles pertenciam à família dos ceratióide, chamados pelos americanos lanterneye fishes (peixes-de-olho-de-lanterna) porque possuem embaixo do olho uma cavidade que abriga bactérias fosforescentes. Durante o dia, esses peixes mergulham a grandes profundidades. À noite, ausente a luz solar, sobem à superfície para se alimentar de plâncton, microorganismos que vivem em suspensão na água. Os cientistas observaram desde então que tais espécies inventaram sistemas próprios de iluminação absolutamente únicos. O Kryptophanaron, que vive nas águas do Caribe, tem sob os olhos uma cavidade que emite luz e que fica coberta por um tipo de persiana escura quando não deseja ser visto. Outras espécies, Anomalops e Photoblepharon, têm uma forma de haste com um farol na ponta, que projetam para frente e para trás da cabeça e também escondem embaixo do olho. O Pachystomias, um peixe predatório chamado peixe-dragão (dragonfish) faz jus ao nome. Não solta fogo, é claro, mas tem uma série de células fosforescentes espalhadas na boca, ao longo do corpo e debaixo do olho.
Muitos desses peixes nunca foram encontrados no Oceano Atlântico e não têm nomes vulgares em português. “Os peixes abissais não costumam cair nas redes dos pescadores e as missões científicas nacionais trabalham mais nas águas rasas da plataforma continental”, explica Lima Figueiredo. Mesmo assim, existe no museu de Zoologia da USP um exemplar de peixe-dragão encontrado na costa do Rio Grande do Sul a cerca de 800 metros de profundidade. Possui o que os ictiólogos chamam barbilhão, um fio que sai por baixo da mandíbula do peixe, com um farol na ponta. Outra espécie conhecida, a dos Chauliodus, ou peixes víboras, tem uma haste que é uma extensão dos primeiros raios da nadadeira dorsal e também luzes dentro da boca para atrair a presa direto ao estômago.
Os dragões-pretos têm a peculiaridade de emitir luz vermelha. Como a maioria dos peixes não enxergam essa cor, tais membros da espécie Pachistomias microdon usam as suas lanterninhas vermelhas para se aproximar sem serem percebidos dos animais que lhes servirão de alimento. Outros peixes se distinguem pelos olhos projetados para a frente, o que lhes permite aproveitar toda a pouca luz existente. Estima-se que essas criaturas são capazes de enxergar no lusco-fusco de quinze a vinte vezes melhor do que os humanos. Os olhos tubulares do Argyropelecus, assim como do Sternoptyx, do Gigantura e ainda do Stylephora, sempre voltados para cima, enxergam contra luz que vem da superfície a silhueta de seus inimigos e da refeição em potencial. O Argyropelecus paciefiecus emite luz verde e azul na mesma intensidade da iluminação procedente da superfície; portanto tornam-se invisíveis. O habitat desempenha um papel importante na cor dos peixes. Os que vivem mais perto da superfície apresentam um tom azulado ou esverdeado, os que vivem no fundo são em geral escuros no dorso e nos lados. Os camarões das profundezas e os peixes da família dos Rondeletiidae são vermelhos porque essa cor não aparece nas águas abissais. Mas, além da cor, também a forma e a estrutura desses peixes são influenciadas pelo meio e pelo tipo de alimento. Muitos se dirigem à noite à superfície para apanhar plânctons, filtrando grandes quantidades de água através da boca e das brânquias, os órgãos da respiração. Outros, carnívoros, desenvolveram dentes avantajados, boca articulada e enorme estômago para o seu pequeno tamanho — finos e compridos, não crescem mais de 30 centímetros.
Os peixes da espécie Saccopharynx foto, parecidos com serpentes, têm a cabeça grande e uma boca que abre e fecha como uma tampa de lixo para engolir a presa. Há pequenos tubarões com grandes dentes embaixo da boca e pequenos em cima. São capazes de morder presas muito maiores do que eles próprios, arrancar um naco de carne do tamanho de metade de uma laranja e fugir deixando no lugar a marca feroz de sua boca. Nas profundezas do oceano, comer não é fácil nem freqüente; desse modo, a satisfação dessa necessidade depende muito do que sobra da produtividade da vida na superfície. A falta de alimento obriga os peixes a serem particularmente vorazes a qualquer momento: eles desconhecem a saciedade. Os Chiasmodon, peixes-pescadores, como são chamados, devoram presas duas ou três vezes maiores do que eles mesmos. As câmaras de controle remoto e, mais recentemente, os pequenos submarinos tripulados documentaram o frenesi das feiticeiras, espécie de enguias, dos isópodes (um grupo de crustáceos) e mesmo de tubarões quando a natureza provê um banquete constituído da carcaça de peixes grandes ou de baleias da superfície. O estômago dos peixes-pescadores se dilata e eles engolem caranguejos, moluscos e peixes avantajados com rapidíssimas dentadas. Os Melanocetus chegam a ter dentes na garganta para impedir que suas presas, tão arduamente caçadas, escapem enquanto estiverem sendo engolidas.
No mundo aquático, a reprodução costuma ser simples: quando chega o momento, basta que o macho e a fêmea soltem esperma e ovos na água para que, da combinação desses elementos, resulte a fecundação. Mas os peixes-pescadores de profundidade são relativamente raros e muito distribuídos por todos os oceanos. Estima-se que, para cada fêmea sexualmente amadurecida, existam de quinze a vinte machos. Portanto, não é de estranhar que vivam menos e tenham praticamente uma única função em toda a sua existência: encontrar uma fêmea e fertilizá-la. Estes solteirões afoitos têm olhos especiais para captar a luz das companheiras a distância. Supõe-se também que, dotados de grandes órgãos olfativos, sejam capazes de segui-las pelo feromônio, o cheiro que elas emitem nas correntes marítimas. Ao encontrar uma fêmea, o macho da espécie Linophryne inica, vinte vezes menor, a ela se liga pela boca. Seus corpos se fundem, a circulação torna-se comum aos dois e o macho fica reduzido à condição de escravo sexual - vivendo exclusivamente para produzir e armazenar esperma a serviço da companheira. Essa incrível simbiose atrai o interesse dos pesquisadores não apenas por tratar-se de uma exótica técnica de reprodução, mas porque talvez venha a ter grande utilidade nos negócios humanos - no tratamento da rejeição em transplantes. O sexo no fundo do mar não cessa de surpreender: em certos casos, a masculinidade ou a feminilidade é apenas uma questão idade. Entre os Gonostoma gracile, o indivíduo amadurece sexualmente como macho com 1 ano. Mas em dado momento do segundo ano de vida transforma-se em fêmea. Na família dos Paralepidídeos, os indivíduos são hermafroditas, com ovários e testículos ao mesmo tempo. Quando não encontram um parceiro, fecundam-se a si mesmos.
Os peixes abissais podem parecer grotescos, bizarros - alguns são imbatíveis em matéria de feiúra. Finos, pequenos, gelatinosos, não têm nenhuma armadura de proteção, como escamas e frequentemente se desfazem quando estudados. Comendo pouco, gastam também pouca energia e nadam apenas o sabor das correntes. Tudo indica que seriam seres primitivos, que não evoluíram durante milhares de anos. Mas o ictiólogo americano Richard Rosemblatt, do Instituto Scripps de Oceanografia, na Califórnia, provou pela estrutura óssea que esses peixes estão no auge da evolução. Como outras espécies, que passaram a viver em praias rasas, ou em baías lamacentas, rios caudalosos ou lagoas, estas mudaram-se da superfície dos mares, seu habitat original, por motivos desconhecidos. Nos abismos profundos onde foram parar, desenvolveram as estranhas características que os transformaram em senhores das trevas.

Revista Super Interessante n° 034

Razões de risco além do sol



Recente estudo americano revela mais seis fatores de risco de melanoma, a mais grave forma de câncer de pele.
Já se sabe que o excesso de exposição ao sol é o maior inimigo da pele. Um novo estudo americano com mais de 6 000 pessoas revela, porém, a existência de seis outros fatores de risco de melanoma, a mais grave forma de câncer de pele. Seriam:
- cabelos loiros ou ruivos .
- muitas sardas grandes nos ombros
- manchas  vermelho-escuras na pele após banhos de sol
-parentes que tenham tido melanoma
- três ou mais queimaduras solares graves na adolescência
- três anos ou mais de trabalho ao ar livre

Um ou dois desses fatores triplicam ou quadriplicam as chances de desenvolver melanoma; a combinação de três ou mais fatores multiplica por 25 vezes tal possibilidade. No entanto, o dermatologista paulista Rubens Sérgio Goes faz uma importante ressalva: "Há casos de pacientes que, sem nenhum desses fatores, tiveram melanoma porque estavam estressados. Ao enfraquecer o sistema imunológico, que destrói as células cancerosas, o estresse põe em pé de igualdade ruivos e morenos, loiros e mulatos".

Revista Super Interessante n° 034

Exercício pode deter câncer



O bioquímico Robert Beyer, da Universidade de Michigan, EUA, conclui numa experiência que os ratos que se exercitam com frequência são mais resistentes ao câncer do que os ratos pouco ativos.
Ratos que se exercitam com frequência são mais resistentes ao câncer do que ratos de vida sedentária. A sugestão, com todas suas promissoras implicações, é do bioquímico Robert Beyer, da Universidade de Michigan, Estados Unidos. Ali, dois grupos de ratos foram inoculados com agentes cancerígenos, depois, enquanto um dos grupos foi forçado a percorrer em laboratório de 10 a 15 quilômetros diários, os outros permaneceram em repouso. Resultado: as células dos animais ativos haviam sido menos afetadas pelo câncer. Segundo Beyer, é possível que a mioglobina e a coenzima Q - substâncias cuja concentração nas células normalmente aumenta nos organismos submetidos a exercícios - tenham neutralizado as letais mudanças químicas induzidas pelas drogas cancerígenas. Se confirmada, essa hipótese pode abrir uma nova linha de pesquisas sobre a prevenção da doença.

Revista Super Interessante n° 034

Como agem os remédios para baixar a febre?



Gleisson A. Nunes
Os medicamentos antitérmicos agem sobre a parte do cérebro conhecida como hipotálamo, onde fica localizado o centro que regula a temperatura do corpo. Quando esta aumenta, o hipotálamo entra em ação para baixá-la por meio de mecanismos como a dilatação dos vasos sanguíneos e a transpiração. Acredita-se que os antitérmicos aceleram esse processo.

Revista Super Interessante n° 034

Por que os dedos ficam enrugados em contato com a água?



Vinícius Maia Oliveira
Depois de certo tempo sob a água, as células da camada mais externa da pele, a epiderme, se enchem de líquido e tendem a expandir-se, a ponta dos dedos, na palma das mãos e na sola dos pés, a epiderme tem maior quantidade de células mortas. Estas deixam a pele mais grossa e fazem uma barreira contra essa expansão que, ocorrendo assim de maneira irregular, se manifesta em forma de enrugamento.

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Enfim, astros de verdade


Astrônomos americanos avistam quatro asteróides entre as órbitas de Marte e Júpiter e resolvem homenagear os quatro integrantes do conjunto, catalogando seus nomes para os quatro asteróides junto à União Astronômica Internacional.
Eles tiveram urna carreira meteórica, venderam quantidades cósmicas de discos e entraram para a história como as mais cintilantes estrelas da música pop do século. Quando as sondas Voyagers, em 1977, levaram para o espaço uma gravação com uma amostra de sons terrestres, a sua canção Here comes the sun só não foi incluída por mesquinhos problemas de direitos autorais. Até recentemente, porém, os Beatles eram astros só na Terra mesmo. Para reparar tamanha injustiça, dois astrônomos americanos, Brian Skiff e Edward Bowell, quando avistaram quatro asteróides entre as órbitas de Marte e Júpiter, resolveram lançar uma homenagem aos integrantes do famoso quarteto de Liverpool. Na hora de catalogar os pequenos astros na União Astronômica Internacional, como de praxe, eles exerceram o direito de batismo que cabe aos descobridores de corpos celestes e os chamaram Lennon (n° 4147 na classificação da UAI), McCartney (4148), Harrison ( 49) e Starr (4150). Let it be.

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Computador de bordo



General Motors americana vai testar carros equipados com computador de bordo, capaz de indicar a melhor rota para o destino pretendido, driblando os engarrafamentos e apontando alternativas.
Os americanos, que gostam de fazer contas e inventaram a expressão tempo é dinheiro, calculam em 1,6 bilhão de horas por ano o tempo perdido em congestionamentos de trânsito por sua população motorizada - sem contar os efeitos da poluição. Essa é, por si só, uma boa justificativa para o projeto que a General Motors está começando a pôr em prática na Califórnia. A exemplo de experiências semelhantes na Europa e no Japão, a empresa pretende testar, durante três anos, doze carros equipados com sistemas eletrônicos capazes de indicar a melhor rota para o destino pretendido, driblando os engarrafamentos no caminho.
O projeto envolve a instalação de sensores ligados ao Centro de Controle de Trânsito de Los Angeles, inicialmente numa extensão de 20 quilômetros de pistas, para detectar a densidade do tráfego e a velocidade dos carros. Repassados instantaneamente aos computadores a bordo dos veículos testados, os dados se transformam em mapas que informam o motorista das condições do trânsito à frente e lhe indicam as melhores alternativas. Como a implantação para valer de um sistema desse tipo depende de grandes investimentos públicos, os técnicos acreditam que isso só acontecerá em uma década.

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Quase- cristais na cozinha



Pesquisadores franceses descobriram que os quase- cristais, ou vidros metálicos, são ideais para o revestimento de panelas e frigideiras, pois são excelentes condutores de calor, resistem à abrasão e à corrosão e suportam temperaturas de até 400 graus Celsius.
Uma empresa francesa pretende revolucionar os utensílios de cozinha usando como revestimento de panelas e frigideiras as chamadas ligas de quase- cristais ou vidros metálicos. Com esse revestimento, espera-se reduzir a 1/10 o tempo de cozimento e assim conseguir maravilhas como fritar um bife em 30 segundos ou cozinhar o arroz em menos de 20 minutos. As ligas de quase- cristais, geralmente à base de alumínio, têm átomos dispostos de forma aproximadamente simétrica, daí o nome. Elas se tornaram conhecidas há seis anos, mas somente em 1987 suas propriedades despertaram o interesse dos tecnólogos. Graças a três pesquisadores franceses se descobriu que os quase- cristais são ideais na cozinha: excelentes condutores de calor, resistem à abrasão e à corrosão e suportam temperaturas de até 400°C.

Revista Super Interessante n° 034

Asas à imaginação


Com seu desenho aerodinâmico especial, elas mantêm os aviões no ar, suportam cargas esmagadoras e guardam no bojo rios de combustível. Levam longe a criatividade da indústria aeronáutica
Cera e penas — isso foi tudo que o mitológico arquiteto grego Dédalo precisou para construir os pares de asas que o libertaram, juntamente com o filho Ícaro, do temível Labirinto de Creta. Aprisionado na própria criação, o engenhoso Dédalo desafiou os deuses com seu vôo e acabou punido: imprudente, Ícaro não ouviu o conselho paterno, voou alto e teve as asas derretidas pelo sol, afogando-se no mar. A lenda de final infeliz, como o de tantos mitos da Grécia Antiga, é a mais conhecida metáfora do imemorial sonho humano de construir asas e voar. Hoje em dia, quando os materiais que permitem ao homem alçar-se aos ares são um tanto mais complexos do que cera e penas, o desafio nem por isso é menor.
Com bons 30 metros de comprimento e cerca de 24 toneladas, as asas de um moderno Jumbo 747 suportam cargas de quase meia tonelada para cada um de seus 511 metros quadrados de área. Carregam no interior quase 200 000 litros de combustível e quilômetros de tubos e fios, além de sustentar turbinas de até 5 toneladas. Sem dúvida, uma proeza da Engenharia aeronáutica à altura dos mais estratosféricos delírios do velho Dédalo. Mas os passageiros do Jumbo, ou, no caso, de qualquer outro avião de verdade, não precisam temer a ira dos deuses — as asas não vão se derreter. Aliás, se os passageiros que se apresentam para uma viagem sentem alguma preocupação quanto ao vôo, esta raramente tem a ver com as asas do aparelho — a não ser como um inconveniente que atrapalha a visão do cenário aéreo nos assentos próximos a elas, embora os viajantes mais experientes saibam que justamente nessa parte da aeronave a estabilidade é maior. De fato, ao contrário da idéia geral, os motores apenas impulsionam o avião, que é sustentado no ar, isso sim, pelas asas, em torno das quais gira toda a fuselagem. Assim, os assentos mais atrás e mais à frente chegam a subir e descer alguns metros em relação ao eixo transversal das asas, cada vez que o avião levanta vôo ou aterrissa, gerando certo desconforto para os passageiros.
Por essa mesma razão, quando a aviação ainda, por assim dizer, engatinhava e os motores possuíam uma fração da potência das gerações seguintes de aparelhos, bastavam simples estruturas de madeira leve ou mesmo bambu, revestidas com telas de tecido e presas com cola, cabos, pregos e parafusos, para funcionar como planos de sustentação. Afinal, as asas não passam de superfícies com perfis especiais que cortam o vento de modo a gerar um impulso ascendente. Segundo as leis da Aerodinâmica, o desenho mais abaulado da parte superior leva o ar a contorná-la mais rapidamente do que na superfície de baixo, resultando daí uma força que empurra o avião para cima. Essencialmente, é o que ocorre ao se empinar uma pipa, na qual a superfície curva de papel de seda e bambu serve como asa e a linha atua como os motores, impulsionando o conjunto para a frente. "Os aerofólios dos carros de Fórmula 1 não passam de asas invertidas", compara o capitão Maurício Pazini Brandão, engenheiro aeronáutico do Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA), em São José dos Campos. "Atuando de modo inverso, mantêm os carros no chão, embora estes alcancem velocidades iguais às de alguns aviões." A sustentação no ar aumenta com o chamado ângulo de ataque, em que as asas cortam o ar. O aumento tem um limite, a partir do qual a sustentação cai repentinamente, devido à formação de uma turbulência na parte superior das asas. Levar o avião até esse limite e depois deixá-lo perder altitude é, por sinal, uma manobra perigosa de pilotos de caça conhecida como estol (do inglês stall, retardar algo mediante subterfúgio).
Para fazer um potente jato ou um pequeno hidroavião subir e descer, os pilotos controlam partes móveis das asas, que aumentam ou diminuem sua superfície e, portanto, sua capacidade de sustentação. Durante a decolagem e o pouso, quando a velocidade é menor e a necessidade de sustentação maior, flaps (abas) na parte de trás e slats (ripas) na parte da frente se desdobram, aumentando as superfícies das asas. Outras engrenagens entram em ação nas diversas manobras. Os ailerons (ponta da asa, em francês) funcionam junto aos flaps sob o comando do manche. São os responsáveis pelo movimento em torno do eixo longitudinal da aeronave, uma manobra conhecida como rolamento. Os spoilers (destruidores, em inglês) são pontos de abertura da superfície das asas que permitem a passagem de ar e a queda de sustentação.
Tampouco se pode esquecer das pequenas asas traseiras que os engenheiros aeronáuticos conhecem como empenagem. Parecidas com as barbatanas de peixes, essas estruturas compõem com a cauda vertical um sistema de eixos que controla a elevação do nariz da aeronave. Quanto maior a empenagem, mais fácil manobrar o aparelho. O caça sueco Viggen, por exemplo, tem empenagem notavelmente grande em relação às asas, além das pequenas falsas asas dianteiras chamadas canard. Todos esses aparatos reduzem a velocidade necessária para a decolagem e, consequentemente, o tamanho das pistas — uma conquista importante, principalmente quando se trata de porta-aviões. Em certas ocasiões, a ponta da asa pode se dobrar cerca de 1 metro para cima ou para baixo, mas não chega a quebrar.
A flexibilidade das asas e a resistência dos materiais de que são construídas passam, aliás, por severos testes na grande indústria aeronáutica. Nos hangares onde é fabricado o Airbus europeu, compressores hidráulicos submetem o equipamento ao que os técnicos chamam ciclos de torção — as asas são dobradas sucessivamente para cima e para baixo a fim de se descobrir seu eventual ponto de ruptura. No interior do revestimento de placas de alumínio, esconde-se uma espécie de costela, de aço ou de titânio, altamente resistente, que abriga as bombas de combustível, os controles hidráulicos e elétricos, o próprio líquido inflamável, que ocupa todos os espaços vazios, e os bens de pouso retráteis. "São muitos os sistemas escondidos nas asas", comenta José Renato Oliveira Melo, gerente de engenharia aeronáutica da Empresa Brasileira de Aeronáutica (Embraer). "Se for necessário voar em lugares muito frios, as asas vão precisar, por exemplo, de equipamentos que impeçam a formação de gelo sobre elas."
Nesse caso, a parte da frente das asas é feita de materiais condutores ligados a filamentos elétricos que funcionam como uma resistência, não muito diferente daquelas usadas nos chuveiros, que mantém a superfície constantemente aquecida. Outras vezes, deve-se deixar espaço para os mecanismos que movimentam as asas para trás em vôos supersônicos, como acontece no caça americano F-14 Tomcat, ou no MiG23/27, soviético. De fato, a forma de flecha diminui a resistência ao avanço. O Boeing 747, por exemplo, tem asas mais enflechadas do que os outros aviões comerciais, que voam a menores velocidades transônicas (próximas à velocidade de som ou 1200 quilômetros por hora) e têm asas retas ou trapezoidais.
Todos esses conceitos aeronáuticos só chegaram a ser estudados e aplicados numa fase recente da história da aviação. A maioria das asas dos primeiros aviões foram imaginadas e testadas  na prática, acumulando desastres. Mas também surgiram, na época, idéias teoricamente avançadas, como as asas traseiras do 14 bis, que podem vir a se tornar comuns nas aeronaves do futuro, desenhadas por computador. Explica-se: quanto mais para trás na fuselagem, mais as asas facilitam as manobras de pouso e decolagem. Hoje em dia, por motivos óbvios, o método de tentativa e erro foi abolido.
Em seu lugar surgiu primeiro o túnel de vento, onde a asa é submetida a uma corrente de ar produzida por um poderoso ventilador que simula as condições de vôo, tomando possível medir ali a eficiência dos modelos. Mais recentemente, poderosos computadores estenderam essa capacidade de simulação além dos limites possíveis de obter nos túneis de vento convencionais. A partir desses testes, surgiu uma pequena porém valiosa inovação no desenho convencional da asa  o wing-let, um prolongamento vertical destinado a diminuir o turbilhão de ar nas pontas tornando a estrutura mais eficiente. A última geração de jatos comerciais possui já esse aperfeiçoamento, previsto também no EMB-145 da Embraer.
A posição em que as asas se prendem à fuselagem é uma das características testadas nos túneis de vento. Assim, asas altas geralmente são utilizadas em aviões de transporte, pois fazem a fuselagem ficar mais próxima do chão, facilitando a entrada das cargas. As asas médias, por sua vez, são as mais eficientes em termos aerodinâmicos, embora com a desvantagem de ocupar muito espaço na fuselagem. Os aviões comerciais têm asas baixas, que protegem a fuselagem em caso de aterrisagens forçadas sem o trem de pouso. Novos sistemas de computadores permitem agora criar aparelhos com o máximo de desempenho e de estabilidade em superfícies de formas singulares. Dando asas à imaginação, essas complexas estruturas nascidas da criatividade dos engenheiros aeronáuticos vencem a todo instante no ar o desafio de Dédalo — e isso não é mito.

Revista Super Interessante n° 034

A volta do filme 3-D



Luiz Guilherme Duarte
A tecnologia que proporciona a exibição de imagens em telas do tamanho de um prédio apresenta sua mais recente superprodução: o renascimento dos filmes em três dimensões.

Entrar para o mundo do cinema pode ser mais fácil do que se pensa. Não é preciso talento, beleza nem ao menos um bom empresário. Basta pôr o pé em certas salas de exibição muito especiais, com enormes telas envolventes, para ter uma sensação bem parecida à de um ator no cenário da filmagem. Eu me senti como se estivesse dentro do filme”, costuma dizer invariavelmente quem já passou por essa experiência, encantado com a qualidade da imagem, que toma todo o campo de visão do espectador a ponto de fazê-lo esquecer onde realmente está. Raras pessoas, entretanto, têm a oportunidade de conhecer a alta tecnologia por trás desse sonho de aspecto tão real. Essa, com efeito, não é uma sessão comum de cinema. Trata-se de uma produção Imax (marca derivada de maximun image ou máximo de imagem, em inglês), um extravagante sistema desenvolvido há duas décadas para a projeção de filmes em telas que podem alcançar o tamanho de um prédio de seis andares.
A explicação para aquele efeito especial ao vivo é, no entanto, simples. Ao se observar o que se passa na tela de uma televisão ou de cinema convencional, a imagem ocupa apenas a parte central da retina; o resto do que se vê ao redor não permite que o espectador perca a noção de onde se encontra. Mas, nesse sistema, em que toda a retina é ocupada pela tela, o impacto psicológico é incomparavelmente mais forte. Todos os anos, mais de 20 milhões de pessoas em quinze países, o Brasil  ainda não incluído entre eles, entram” desse modo para algum filme, tendo a impressão de realmente terem sido transportados para lugares ou situações inacessíveis na vida real: as profundezas do Grand Canyon, nos Estados Unidos, o interior de um átomo ou o espaço sem fim.
A isso tudo a Imax acaba de acrescentar uma novidade ainda mais apaixonante — o sistema Solido, que projeta imagens tridimensionais em uma tela côncava de 24 metros de diâmetro, o suficiente para ocupar todo o campo de visão da platéia e manter o efeito espetacular mesmo quando as formas na tela se aproximam do espectador. A estréia do Solido deu-se em abril último, na Expo 90, uma feira internacional em Osaca, Japão, com o filme Echoes of the Sun (Ecos do Sol), uma co-produção da Imax-Fujitsu, com muitas imagens criadas por computador. Seis anos atrás, no decorrer das três missões do ônibus espacial americano Columbia, os astronautas recorreram à técnica desenvolvida pela empresa canadense para registrar imagens do lançamento do satélite de pesquisas LDEF (sigla em inglês de Equipamento de Exposição de Longa Duração).
O resultado foi o primeiro filme do gênero Imax, The dream is alive (O sonho está vivo), visto desde então por mais de 23 milhões de pessoas com narração em dez línguas. Em janeiro passado, os astronautas a bordo da mesma nave Columbia voltaram a empunhar as câmeras, desta vez para documentar o resgate do LDEF e filmar de perto o globo para uma nova película, Blue planet (Planeta azul), sobre a fragilidade da Terra. Em lugar de competir com Hollywood e com as grandes empresas exibidoras, as 65 produções Imax feitas até agora — com duração de 40 minutos em geral — abastecem uma coleção de 72 cinemas especialmente construídos em centros culturais, museus. parques e feiras de exposições. A maioria das salas se localiza nos Estados Unidos, Canadá e Japão. A primeira foi aberta em 1971 na cidade canadense de Ontário.
Os maiores cinemas, com até 1000 lugares, como o de Gurnee, Illinois, inaugurado em 1979, têm uma tela plana vertical dez vezes maior que o tamanho usual de 10,5 metros por 4,5. Mas também existem outros menores, com capacidade para receber até 500 pessoas, que possuem uma tela côncava de aproximadamente 25 metros de diâmetro. É o caso do cinema instalado no célebre hotel Caesar7rsquo;s Palace, em Las Vegas. Essas últimas salas empregam a tecnologia Omnimax, uma variação surgida dois anos depois da Imax. Instalada até hoje numa pequena casa de estilo vitoriano em Toronto, no Canadá, a Imax Systems, uma indústria cinematográfica comparável às americanas, nasceu das experiências de três jovens cineastas nos telões da Feira de Exposições de Montreal em 1967.
Aclamados pelo público e pela crítica, Graeme Ferguson, Roman Kroitor e Robert Kerr se convenceram de que as telas grandes poderiam gerar um novo conceito de cinema e se impuseram o desafio de criar a base tecnológica para tanto. Como os sistemas de projeção utilizados nos telões da época ainda eram de baixa qualidade, a trinca se pôs a desenvolver um novo aparato, usando um único e potente projetor em vez dos múltiplos aparelhos que vinham sendo empregados. O primeiro passo foi comprar a patente do recém-criado sistema de projeção australiano Rolling Loop, que faz o filme rodar sem trancos, no sentido horizontal (o movimento das imagens resulta de uma sequência de  fofos estáticas que rodam uma ao lado da outra). O processo clássico é vertical (um quadro sobre o outro).
Durante a projeção, esse movimento permite que cada imagem se encaixe em pontos fixos, evitando distorções. Além disso, o filme fica firmemente preso a  vácuo contra a parte de trás das lentes, de modo a ser exibido com a perfeição de uma foto normal num projetor de slides. O Loop foi incorporado, então, a um projetor totalmente novo, que dispõe de lentes especiais de larga amplitude de imagem e de um controle de emissão de luz capaz de transmitir um terço a mais de brilho que os sistemas tradicionais. Também as câmeras precisaram ser totalmente redesenhadas para utilizar os maiores fotogramas da história do cinema. Os filmes de 70 milímetros de largura por quase 50 de altura são dez vezes maiores que os formatos convencionais de 35 milímetros e o triplo dos 70 milímetros utilizados em telas de 180 graus, como o existente no Playcenter, em São Paulo.
Para se ter uma idéia do que representa essa diferença de tamanho no projetor, o filme da Imax tem fotogramas com quinze perfurações laterais para fixação nos aparelhos, enquanto o filme comum da mesma bitola tem só cinco. Aí vale a regra segundo a qual quanto maior o quadro do filme, melhor a qualidade da imagem  mas também maior precisa ser a tela. Juntos, o quadro grande da película e o complexo projetor respondem pela qualidade superior dessa técnica, apresentada pela primeira vez na Expo 70, a mesma feira em Osaca onde estreou recentemente o Solido em 3-D. A reação entusiástica da platéia deveu-se também a outra surpresa preparada pelos inovadores canadenses. A maioria dos espectadores saiu do salão de exibições dizendo-se impressionada não pela imagem — mas pelo som.
De fato, essa refinada tecnologia de cinema partiu do princípio de que não bastaria ver para crer e sentir-se parte do filme. Seria preciso ver e ouvir. Com suas câmeras especiais na mão e essa idéia na cabeça, os pesquisadores da lmax desenvolveram um sistema de som estereofônico com seis canais, o suficiente para distribuir os acordes de modo que cada nota venha de alto-falantes diferentes. Não é de admirar que em 1986 os criadores da Imax tenham recebido o prêmio de Inovação Tecnológica da Academia de Artes e Ciências de Hollywood, aquela mesma que promove a distribuição anual de Oscars. Na verdade, esse é um feito singular na longa história do cinema de telão. Em 1927, o pioneiro diretor francês Abel Gance (1889-1981) usou imagens múltiplas em uma tela três vezes mais larga que a habitual para exibir, com relativa repercussão, seu épico mudo Napoléon.
Nos anos 50, a técnica do Cinerama lotou em muitos países amplos cinemas como o Comodoro, que existe até hoje em São Paulo, arrebatando os espectadores em vertiginosos passeios aéreos entre montanhas. O problema é que o arranjo concebido pelo americano Fred Waller (1886-1954), diretor de efeitos especiais dos Estúdios Paramount, envolvia três projetores que nunca sincronizavam suas imagens com absoluta perfeição. Outro processo mais recente, Showscan, consegue gerar imagens altamente definidas, rodando o filme ao ritmo de sessenta quadros por segundo, em vez dos 24 de praxe. Criado por Douglas Trumbull, outro talentoso inventor de efeitos especiais, o Showscan usa filmes de 70 milímetros e quatro vezes mais luminosidade em telas também quatro vezes maiores.
A dificuldade nesse caso não é técnica, mas financeira: os filmes acabam custando até 3 milhões de dólares a mais — o que é muito dinheiro mesmo para as contas grandiloquentes da indústria cinematográfica —, sem falar que a fatura da adaptação necessária em cada sala de exibição somaria outros 300 mil dólares. Em suma, ainda quando tais tecnologias funcionavam,  geralmente se mostravam pouco versáteis ou muito caras. Afinal, quem iria assinar gordos cheques para produzir um filme que não tem cinemas adequados para ser assistido? E, na outra ponta do negócio, quem iria abrir a carteira para reformar uma sala de exibição sem a garantia da oferta regular de filmes especiais para serem projetados ali?
Esse dilema que cortou o avanço de novas técnicas de cinema, foi superado pela Imax Systems, a qual cuidou de tomar a si igualmente cada fase da produção e da comercialização de seus filmes. Para garantir a sobrevivência da tecnologia que criou, a empresa foi obrigada a expandir-se em todas as direções e atuar em vários campos: equipamentos, salas de exibição, distribuição, consultoria técnica para produção de filmes. Os catorze astronautas que filmaram The dream is alive, por exemplo, receberam treinamento de quase um ano para operar alguns dos mais de cem equipamentos que a empresa coloca à disposição dos produtores de filmes. “Estamos vivendo uma fase equivalente àquela de 1910, quando a indústria do cinema estava apenas começando e tudo precisava ser feito”, entusiasma-se Graeme Ferguson.
Com esse estado de espírito, a Imax desembarcou em Osaca há três meses com uma bagagem que incluía três experiências com sistemas desenvolvidos na última década. O primeiro deles, apropriadamente chamado O Tapete Mágico, usa a mesma tecnologia original numa sala de exibição totalmente diferente, com duas telas gigantes — uma de 18 metros de altura por 25 de largura em frente à platéia e outra, sob seus pés, pouco mais larga, visível através de um piso transparente. Durante as filmagens, um mecanismo sincroniza duas câmeras, uma na horizontal, outra inclinada para baixo, de modo a gerar dois filmes, projetados em cada tela.
O segundo sistema revive os filmes com imagens em três dimensões (3-D). Tais filmes, que requerem o uso de óculos especiais pelos espectadores e foram testados originalmente pelos Estúdios Metro por volta de 1935, jamais conseguiram ser realmente convincentes. Mas, desde sua avant_première na Feira de Exposições de Vancouver (Canadá) em 1986, o sistema proposto pela Imax tem feito muitas pessoas tentarem agarrar as imagens. O principio é o mesmo utilizado desde os anos 30, isto é, duas imagens do mesmo objeto projetadas simultaneamente, vistas através de lentes com filtros especiais que simulam a profundidade. Neste caso, a melhoria da técnica pode ser sentida na diferença de qualidade das imagens, perfeitamente alinhadas e em foco.
Mas a novidade das novidades foi o sistema Solido, com sua imagem tridimensional e seu telão de 24 metros. O filme de demonstração — 17 minutos de imaginosa computação gráfica sobre a química da fotossíntese — pode ser visto com a ajuda de óculos especiais bem diferentes dos cartões coloridos usados na primeira e frustrada geração de filmes 3-D. Feitas de cristal líquido, material utilizado em relógios  digitais e calculadoras, as lentes tornam-se instantaneamente opacas ao receber uma leve corrente elétrica, regulando assim a entrada de luz da mesma maneira como os obturadores das máquinas fotográficas. Controladas por um sinal infravermelho procedente do sistema de projeção, as lentes abrem-se e fecham 24 vezes por segundo, em sincronia com um par de projetores, apresentando, para cada cena, primeiro a imagem vista pelo olho esquerdo, depois, pelo olho direito. Naturalmente, essa alternância não chega a ser percebida pelo espectador.
A experiência é tão impressionante que o próprio cinema parece mover-se e voar”, declama o cineasta canadense Ben Shedd, que, além de produzir filmes para a Imax, está escrevendo um livro com o provável título Exploding the frame (Explodindo o quadro), em que analisa a estética do telão. A uma conclusão ele já chegou: a TV de alta definição tornará essas tecnologias imprescindíveis no futuro. Afinal, as pessoas não irão sair de casa para ver algo menos excitante do que já puderem ver em sua própria sala de visita.

As dimensões do Solido
O que é e como funciona o novo 3-D
Quando se olha para algo, cada olho vê uma imagem plana de ângulos ligeiramente diferentes entre si. O cérebro combina tudo numa única imagem tridimensional. O sistema Solido usa dois projetores. Os espectadores recebem óculos com lentes de cristal líquido para criar o efeito de três dimensões.

1. A lente do olho direito é escurecida enquanto um projetor apresenta a imagem dirigida ao olho esquerdo.
2. A seguir, com o olho esquerdo tapado, inverte-se o processo. Como tudo acontece rapidamente, o cérebro une as duas imagens, dai resultando o efeito 3-D.

3. 0 cinema de tela côncava aumenta a ilusão ao impedir que o espectador veja onde termina a imagem.
A alternativa do iglu
O Brasil pode ser um país tropical, mas muitos brasileiros já entraram alguma vez numa espécie de iglu, a habitação típica dos esquimós — sem ir muito longe. Mantido inflado por um sistema de ventilação constante, o iglu de lona que serve como sala de exibição itinerante para os filmes de ação em telas de 180 graus é uma forma conhecida em diversas cidades desde o final da década de 70. Criada pela empresa americana Omnivision ainda na década anterior, essa tecnologia é, na verdade, bem mais simples que a da Imax. Metade da parede do próprio iglu — uma porção de esfera de 16 metros de diâmetro por 9 de altura — é revestida de branco e constitui a tela para as imagens de um projetor colocado na parede oposta. “Trata-se de um projetor de cinema comum, com filme de 70 milímetros e uma lente importada que gera a curvatura da imagem”, descreve o engenheiro mecânico Laerte de Souza, responsável há dez anos pelos equipamentos do parque de diversões Playcenter, em São Paulo.
No cinema permanente montado ali em 1978, mais de 60 milhões de pessoas já assistiram a uma dezena de filmes recheados de imagens apropriadas como corridas de carros, vôos sobre precipícios e passeios de montanha-russa. A maior diferença em relação aos sistemas comuns está na lâmpada utilizada, feita de quartzo e de tungstênio, que gera 7 500 watts de luz, em vez dos 4 mil usuais. Além disso, os filmes são rodados em velocidade mais lenta que o normal para que pareçam acelerados durante a projeção. "A idéia é tornar todo o cinema uma lente em que o público se coloca em pé no ponto focal durante uns 12 minutos e experimenta a sensação de desequilíbrio provocada pelas imagens na retina", define o engenheiro Laerte, que morre de rir ao lembrar das pessoas que terminam a sessão  estateladas no chão.

Revista Super Interessante n° 034

Relatividade ao vivo na tela



Estudantes dos EUA desenvolvem programa de computador capaz de aplicar as leis da Relatividade à forma dos objetos em movimento, reproduzindo-a na tela do computador.
Segundo a Teoria da Relatividade, os objetos em movimento ultra-acelerado podem tomar formas intrigantes, mas praticamente indescritíveis. Que aparência teria, por exemplo, uma cafeteira que, em vez de repousar placidamente sobre a mesa, atravessasse a sala de jantar a 300000 quilômetros por hora? A resposta foi dada agora, pela primeira vez, por dois estudantes da Universidade Carnegie Mellon, de Pittsburgh, Estados Unidos, autores de um programa de computador capaz de aplicar as leis da Relatividade à forma dos objetos em movimento - e mostrar o resultado no monitor.
As imagens são ao mesmo tempo divertidas e valiosas, pois podem ajudar os astrofísicos, entre outras coisas, a identificar a forma estática de um corpo celeste distorcido pela altíssima velocidade. Aos olhos de um observador, a cafeteira dos criativos universitários americanos se tornaria bojuda na direção em que se movesse. Uma esfera que se aproximasse a 99% da velocidade da luz tomaria a forma de um cubo de lados arredondados: se fosse vermelho ficaria azul, Maravilha-se Robert Dung, um dos autores do programa: "Os efeitos são realmente espantosos".

Revista Super Interessante n° 034

Como funciona o radar usado nas estradas para medir a velocidade dos carros?


Luís Fernando e Klênio de Castro
Trata-se de um transmissor de rádio que emite pulsos curtos e espaçados de ondas. Qualquer objeto no percurso do feixe transmitido reflete os sinais que serão captados de volta por um rádio receptor. Um carro em movimento reduz o espaço entre as ondas, ao refleti-las e aumenta a sua frequência. Quanto maior a frequência, maior a velocidade do veículo.

Revista Super Interessante n° 034

Qual a maior e a menor estrela conhecida?



André Alves de Moraes Gobatto
Situada na constelação de Auriga, a 465 anos-luz de distância, a maior é a Epsilon Auriga, cujo raio é 1278 vezes maior que o do Sol, que tem 690000 quilômetros. Excluídas as estrelas de nêutrons, de dimensões apenas estimadas, a menor parece ser uma anã branca - estrela que se encontra no estágio final de sua evolução - denominada LP 327-16, descoberta em l' 2, com um raio de 850 quilômetros a 1 anos-luz de distância.

Revista Super Interessante n° 034

A origem da luz cinzenta na Lua crescente


Ronaldo Rogério de Freitas Mourão
Explicação sobre a luz cinzenta, que pode ser observada no início da Lua crescente.

No início da Lua crescente, pode-se  observar, além da região diretamente iluminada pelo sol - um fino e delicado crescente -, todo o hemisfério lunar com um brilho muito difuso e tênue: é a luz cinzenta, assim chamada porque sua coloração lembra a tonalidade incandescente das cinzas. Esta luz permite ver todo o hemisfério lunar, mesmo quando só uma porção muito reduzida é iluminada pelo Sol. Os povos antigos ficavam perplexos com essa luz. Alguns acreditavam que a Lua fosse ligeiramente fosforescente.
Em consequência, essa luz própria possibilitava observar a totalidade do astro, numa época em que, segundo a teoria das fases lunares, só se visualizava uma região muito pequena da superfície lunar. Tal suposição não estava de acordo com o que ocorria durante os eclipses totais da Lua, pois o satélite jamais desaparecia completamente nessas ocasiões. Astrônomos como o grego Possidônio (135-51 a.C.) sugeriam que a matéria da Lua era diáfana, de tal modo que os raios solares ao penetrarem além da superfície diretamente iluminada se dispersavam, como os raios luminosos quando penetram no interior das nuvens.
Essa explicação foi defendida pelo matemático polonês Vitellus no século XIII e pelo astrônomo alemão Erasmus Reinhold (1511-1553), trêsséculos mais tarde. Já o célebre astrônomo dinamarquês Tycho Brahe (1546-1601 ) dizia que o clarão tinha origem na luz de Vênus, que após iluminar a face oculta do nosso satélite se refletia em direção à Terra. Outros chegaram a atribuir o clarão à própria luz das estrelas. O problema só foi definitivamente resolvido em 1604. Quando  Johannes Kepler (1571-1630) divulgou a explicação de seu mestre de matemática, o alemão Michael Mostlin (1550-1631).
Para ele, a verdadeira causa do fenômeno estava na luz solar que, após iluminar a Terra se refletia em direção à Lua, da qual retomava à Terra após uma segunda reflexão com o aspecto de uma luz incandescente. Na Itália, atribui-se essa hipótese a Leonardo da Vinci (1452-1519), que a teria elaborado em seus manuscritos. O grande mérito, no entanto, ficou mesmo com Mostlin, que apresentou suas observações antes que os cadernos e anotações davincianas fossem publicadas.
Na verdade, a luminosidade que aparece no lado não- iluminado do disco lunar, quando a Lua é visível sob a forma de um fino crescente. provém da luz que a Terra reflete sobre o disco lunar. As "fases" da Terra vistas da superfície lunar são complementares às fases da Lua. Assim, quando os habitantes da Terra vêem a Lua nova, os astronautas na Lua vêem a Terra cheia. À medida que a Lua cresce, esse brilho diminui. Em consequência, a intensidade da luz cinzenta depende não só da porção da Terra visível da Lua mas também do estado menos ou mais nebuloso da sua atmosfera.
Esta reflexão da luz solar pelo globo terrestre é bastante intensa se considerarmos que a extensão superficial da Terra é cerca de treze vezes superior à da superfície lunar. Ao aceitarmos a explicação de que a luz secundária é que permite ver a porção da Lua não iluminada, constatamos que esse clarão vai diminuir de intensidade à medida que a Lua crescente no poente, após o pôr-da-sol, caminha para o plenilúnio. E irá aumentar no intervalo que vai do dia da Lua cheia até a minguante, quando no nascente ela desaparece de madrugada sob os efeitos dos raios do Sol.
As medidas da luz cinzenta permitem determinar a intensidade da luz terrestre como se a tivéssemos medido a partir da Lua. Sabendo qual é a fração da luz solar refletida pela superfície lunar, é fácil, com base na intensidade da luz cinzenta. deduzir a intensidade da luz terrestre. Por isso, sabia-se antes da chegada do homem à Lua que a Terra reenviava para o espaço cerca de 40% da luz incidente, numa coloração azulada. Isso foi confirmado mais tarde pelos satélites artificiais em órbita muito elevada. Os observadores da luz cinzenta estão habituados a notar que o crescente lunar parece sempre maior que a parte escura da Lua. Trata-se de uma ilusão de ótica, provoca da pela irradiação que faz com que região brilhante pareça maior que a escura.

Revista Super Interessante n° 034

Trevo de quatro folhas no Cosmo


Astrônomos do Observatório Europeu do Sul detectaram quatro imagens diferentes de um mesmo quasar, na forma de um trevo de quatro folhas. Trata-se do fenômeno da lente gravitacional, previsto por Einstein.
Algo parecido a encontrar um trevo de quatro folhas ocorreu há pouco com astrônomos do Observatório Europeu do Sul, ao detectarem, por pura sorte, um estranho fenômeno cósmico. Eles viram quatro imagens diferentes de um mesmo quasar, o H1413-117, corpo luminoso situado a colossal distância a Terra, na forma de um trevo de quatro folhas. Trata-se do fenômeno da lente gravitacional, previsto por Einstein e comprovado pela primeira vez há dois anos. Quando se alinham dois ou mais astros a distâncias diferentes da Terra, a radiação emitida pelo corpo mais longínquo passa a se curvar, atraída pelo campo de gravidade do astro mais próximo ou de alguma galáxia invisível aos olhos terrestres. O resultado é uma ilusão de ótica com múltiplas imagens do astro mais afastado.

Revista Super Interessante n° 034